Outro dia, conversando com uma pessoa sobre um desenho
animado, expus minhas reflexões a respeito do comportamento ético [ou não] dos
personagens do enredo. A resposta que tive foi: como alguém faz reflexões desta
natureza a partir de um desenho?
Eu apenas disse que percebia a oportunidade de aprendizado
em todos os ambientes e ocasiões, especialmente, naqueles travestidos de
isentos e/ou supostamente destituídos de julgamentos de valor. Pelo simples
fato de que isso não existe.
Hoje, sigo o mesmo caminho, depois de ter lido o capítulo Sansa, de A Tormenta de Espadas, Volume Três de As Crônicas de Gelo e Fogo, de George R. R. Martin, nesta edição da
Editora Leya, publicada em 2015, e que conta com 840 páginas.
Se você ainda não leu esta saga, não conhece a série e ainda
pretende conhecer, sugiro que pare a leitura e retorne em outro post. Vou citar
detalhes deste episódio que, sim, é significativo ao enredo.
Não acredito que o ambiente no qual as pessoas estão inseridas
seja determinante de seus respectivos futuros. Ele influencia fortemente, sem
dúvida, mas não o determina. Todos nós temos escolhas e essas são baseadas em
nossos valores, construídos ao longo da vida.
Neste capítulo, Sansa Stark é obrigada a casar com Tyrion
Lannnister, o anão. A obrigatoriedade da união imposta aos dois por interesses
políticos e estratégicos da guerra dos tronos, incluía a consumação do
casamento, na noite de núpcias. Mas, apesar de toda a postura questionável de Tyrion,
ele opta por não obrigar Sansa a ter relações sexuais com ele, diga-se estuprá-la,
a menos que ela o deseje, algum dia.
Ele está tão assustado quanto eu, percebeu Sansa. Isso talvez devesse tê-la deixado mais compreensiva para com ele, mas não a deixou. Tudo que sentiu foi pena, e a pena é a morte do desejo.
Se levarmos em consideração apenas o ambiente, Tyrion não tinha
razão para adotar uma postura ética. Mas esta é consequência da construção que
ele fez de si mesmo, a despeito das relações familiares e da cultura socialmente
defendida no seu entorno.
-Por minha honra Lannister - disse o Duende -, juro não tocá-la até que queira que eu o faça.Precisou de toda a coragem que possuía para olhar aqueles olhos desiguais e dizer:- E se eu nunca quiser que faça isso, senhor?A boca dele contraiu-se como se o tivesse esbofeteado.- Nunca?- Sansa tinha o pescoço tão tenso que quase não conseguiu assentir. – Ora - disse ele -, é por isso que os deuses fazem as prostitutas, para duendes como eu. – Fechou seus dedos curtos e grossos num punho e saltou da cama.
Em situações como essa, o que nos orienta é o livre-arbítrio.
Independente da posição que cada um de nós ocupe nas relações de poder, o bem ou
o mal que fazemos aqueles com os quais nos relacionamentos é resultado das
nossas escolhas. E, neste processo, não há fator ambiental determinante. Se
assim fosse, Tyrion teria violentado Sansa, conforme a orientação do pai, e
ponto.
Ao optar por preservá-la, o anão também preserva a própria
integridade moral, por meio de uma conduta ética que, a despeito deste
episódio, não é uma constante nos posicionamentos que adota.
Essa dualidade revela a contradição da constituição humana.
O que nos move para um lado ou para o outro é o uso da racionalidade, a partir
dos valores que nos orientam. E, nem sempre – ou quase nunca –, esta racionalidade
nos leva a escolha totalmente lógicas.
Deu um nó?
Acredito que sim. Mas é isso o que nós somos, seres em mutação
constante e nem um pouco determinados pelo ambiente no qual estamos inseridos.
Temos escolhas.
Quais são as suas?
⇒Dia 11|365
Nenhum comentário:
Postar um comentário