Os
relatos sobre situações de violência que acompanhamos diariamente na imprensa,
nos fazem pensar, equivocadamente que, apesar da proximidade cada vez maior dos
personagens envolvidos, tais situações nunca nos terão como protagonistas. Até
que um dia nos tornamos alvo.
Mesmo
assim, não é algo tão simples de identificar, porque, muitas vezes a situação é
surreal ao ponto de distanciar o significado daquilo que ele realmente é, até
que a consciência dos fatos o revelem o que eles verdadeiramente são.
Isso
acontece com todo tipo de violência.
Há
poucos dias, fui vítima de racismo. E o uso do termo exato só se deu horas
depois, quando o calor da situação já tinha passado e a reflexão se tornado
mais racional.
A instituição
de ensino na qual trabalho recebeu uma equipe do Ministério da Educação (MEC)
para avaliar as condições para oferta de ensino na modalidade a distância. Os três
professores visitaram o estúdio enquanto eu me preparava para gravar a apresentação
de uma disciplina quando uma das docentes integrantes da equipe questionou se
há na instituição a exigência às professoras de fazer escova para gravar os vídeos.
No
momento em que a pergunta foi feita, estavam no estúdio eu, parte dos
integrantes do Núcleo de Educação a Distância, técnicos especialistas
responsáveis pela manutenção do ambiente e equipamentos, a reitora, pró-reitores,
mantenedora e os dois outros professores da comissão do MEC.
Prontamente
respondi que não há esse tipo de orientação por parte da instituição e que,
justamente por isso, eu estava ali, com meu cabelo cacheado. Ela se direcionou
à equipe técnica alegando que o meu cabelo poderia causar instabilidade às
imagens, por não ser liso. Os profissionais responsáveis explicaram que a estrutura
técnica do estúdio, como a utilização do fundo infinito e branco, viabilizavam
a estabilidade da imagem.
Descontente
com a resposta, a professora saiu do estúdio ainda questionando a não
obrigatoriedade de escova no meu cabelo.
A situação
gerou desconforto generalizado, por diversos aspectos.
O
primeiro é que o papel dela, enquanto avaliadora do MEC, é verificar as condições
estruturais para a oferta do ensino na modalidade a distância sob a orientação de,
em nenhum momento, fazer juízo de valor a respeito de nenhum dos aspectos sob
análise.
O
segundo é que a insistência no assunto cabelo deixou claro que a preocupação da
avaliadora não estava voltada às questões técnicas, mas sim na racial.
Passados
alguns dias do episódio, fica cada vez mais claro o sentimento de angústia causado
pelo julgamento de uma característica física em detrimento da qualidade ou
falta dela do trabalho realizado.
Para
pessoas como a avaliadora do MEC, não importa o que é feito, mas por quem é
feito. Neste sentido, a dedicação, o empenho de toda a instituição foi deixado
em segundo plano no momento em que a questão racial, destacada pelo meu cabelo
cacheado, foi exaltada.
Se
por um lado o preconceito extremado daquela que se apresenta como educadora foi
expresso na hostilidade revelada, a postura da instituição foi oposta a isso. A
preocupação com o meu bem-estar pessoal e no registro oficial do episódio aos órgãos
responsáveis reforça a fé que tenho na humanidade e na construção de uma sociedade
mais justa.
Racismo
existe, é uma violência, é crime, e não pode ser ignorado.
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