29 setembro 2017

Persépolis


Existem fatos históricos que são tão complexos que tornam de difícil entendimento os relatos a respeito deles, pois, por mais simplistas que sejam, sempre deixam nuances de fora e, por isso mesmo, permanecem incompreensíveis.

A questão dos conflitos entre Irã, Iraque e demais países da região no Oriente Médio é um bom exemplo desta realidade. E, por esta razão, é que a forma escolhida para que tais relatos sejam feitos tem impacto significativo na apreensão do contexto apresentado.

Neste sentido, a escolha de Marjane Satrapi pela produção de um romance gráfico autobiográfico para expor ao mundo as transformações pelas quais o Irã passou ao longo dos anos e, em especial, as impostas às pessoas, suas culturas e forma de viver tornam a história em quadrinhos (HQ) Persépolis, uma obra indispensável aos interessados nos conflitos que marcam a história não só daquela parte do mundo, mas de todo o globo terrestre.

O livro publicado pela Companhia das Letras em 2007 reúne os quatro volumes da HQ que tem a autora iraniana como narradora. A narrativa nos coloca em contato com a vida de Marjane Satrapi a partir dos 10 anos, idade na qual ela começa a relatar, entre outras coisas, como as alterações no sistema de governo resultavam em mudanças na condução do ensino no País, tanto em relação a forma, quanto em relação ao conteúdo.

 No decorrer histórias, o leitor é guiado por uma viagem pela constituição familiar de Marjane e das intensas relações que marcaram seu desenvolvimento de maneira significativa. Os valores e cultura cultivados neste ambiente tornaram-se parâmetro para ela que teve a oportunidade de estudar no exterior, enquanto seus familiares permaneceram no meio do fogo cruzado -  literalmente – no Irã.

Na vida você vai encontrar muita gente idiota. Se te ferirem, pensa que é uma imbecilidade deles que os leva a fazer o mal. Assim você vai evitar responder às maldades deles, porque não tem nada pior no mundo do que a amargura e a vingança... seja sempre digna e fiel a vocês mesma.


O contato com novas culturas levou a autor a passar por um período de descoberta de si mesma, intensificado pelas características inerentes à adolescência, assim como o papel da mulher no mundo, em especial, enquanto representante de um País tão negativamente estereotipado.

Alias, ser mulher no Irã não era - e ainda não é fácil -, mas tampouco é possível dizer que ser mulher iraniana no mundo dito civilizado é mais fácil. O preconceito com o qual foi obrigada a conviver levou Marjane de um processo de negação de sua origem, na tentativa de ser aceita, à compreensão de que o fortalecimento de sua identidade seria o melhor caminho de se tornar mais forte e enfrentar o desconhecimento social, postura que aprendeu com os pais e demais familiares que não se deixaram enfraquecer, apesar de toda adversidade enfrentada.

É o medo que nos faz perder a consciência. É ele também que nos transforma em covardes.


Persépolis é muito mais do que a história de uma menina iraniana. Esta é uma história de sobrevivência dos povos e suas respectivas culturas, diante da ganância e do oportunismo de poucos países, mas financeira e militarmente mais bem estruturados. Este retrato social é feito pelo olhar de Marjane que revela também, como foram seus contatos com autores como Sartre, Marx, Durkheim, entre outros, que influenciaram ou não sua maneira de ver o mundo.

Grito nenhum poderia aplacar meu sofrimento e minha raiva.


Persépolis – O Filme

Ainda no ano de 2007, o livro Persépolis foi transformado em animação, disponível no YouTube (clique aqui), com direito a indicação como um dos três melhores filmes de animação ao Oscar daquele ano. A obra é bem fiel ao livro, mas como toda adaptação, não comporta a extensão da obra literária.

Tanto o livro, escolhido para o mês de setembro do projeto #leiamulheresnatal, quanto o filme, que é francês e produzido em preto e branco, segundo o modelo da história em quadrinho, valem cada minuto de dedicação, seja pelo contexto histórico e contemporâneo, seja pelas histórias de vidas! 😊

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