A conclusão da Parte IV do livro Anna Kariênina, de Liev Tolstói, nos leva a ultrapassar cinquenta
por cento de sua totalidade, ao mesmo tempo em que coloca o leitor diante do
clímax no enredo que é capaz de tirar o fôlego, arrancar lágrimas e sorrisos de
maneira surpreendente.
Nos XXIII capítulos que integram esta parte da obra, o autor
fala sobre o poder do perdão, da generosidade e do amor que o ser humano é
capaz de vivenciar em relação ao outro, ao nos colocar de forma simultânea,
diante do reencontro de Liévin e Kitty, e dos desencontros que envolvem a relação
de Anna Kariênina, Vrónski e Aleksiei Aleksándrovitch.
Liévin e Kitty se reencontram em um jantar na casa de
Oblósnky e Dolly, em Moscou. Na ocasião, ambos percebem que o sentimento que os
envolve não mudou e, durante uma conversa que, sem dúvida, é uma das cenas mais
lindas relatadas até este momento da obra, o perdão pedido e concedido pelos
desencontros do passado os aproxima ainda mais e aflora o amor que até bem
pouco tempo era causa de sofrimento, em decorrência de escolhas feitas.
Ele tomou um giz com os dedos tensos, trêmulos e, depois de parti-lo ao meio, escreveu as letras iniciais do seguinte: “Nada tenho para esquecer e perdoar, eu nunca deixei de amar a senhora”.
O reencontro dessas almas envolve não apenas o casal, mas os
familiares e amigos próximos que foram testemunhas dos sofrimentos, lamentos e
momentos de desesperança que os acompanharam desde o baile durante o qual se
deu o encontro entre Anna Kariênina e Vrónski.
Durante muito tempo, Liévin nada conseguiu falar, não só porque temia corromper com palavras a elevação do seu sentimento, mas também porque, toda vez que queria falar alguma coisa, em lugar de palavras, sentia subirem aos olhos lágrimas de felicidade. Segurou a mão dela e a beijou.
Se por um lado, o perdão fortaleceu a união entre Liévin e
Kitty, o perdão que Aleksiei Aleksándrovitch concede a mulher e ao amante, no
momento em que a encontra doente após o nascimento da filha dela com Vrónski.
O perdão e a generosidade de Aleksiei Aleksándrovitch são,
tanto para Anna Kariênina, quanto para Vrónski, torturantes demais por reforçar
para cada um, sob suas respectivas óticas, o mal que a incapacidade de
controlar a paixão que os unia foi capaz de causar não apenas aos três, mas aos
filhos, familiares e conhecidos de todos eles.
Aleksiei Aleksándrovitch sentia-se completamente calmo e em harmonia consigo mesmo e não via na sua situação nada de extraordinário, nada que fosse preciso modificar. (...). Sentia que, além da boa força espiritual que guiava sua alma, existia uma outra, igual ou ainda maior, uma força imperiosa que guiava a sua vida, e ele sentia que essa força não lhe traria a serenidade resignada que almejava.
Apesar disso, o sentimento de culpa não foi suficiente para
separar os dois que, mais uma vez, se rendem ao sentimento que os aproxima tão
fortemente. Anna e Vrónski largam tudo -
filhos, marido, trabalho, bem como a possibilidade do divórcio - e seguem juntos para o exterior, para ficar
longe da realidade que os oprime e, assim, viver a plenitude do amor que
sentem.
(...) ela é uma dessas mulheres que não conseguem brincar com os próprios sentimentos.
A forma como Tolstói relata as cenas e os pensamentos das
personagens nos envolve neste enredo de forma a nos tornar integrante das relações
apresentadas no livro. A escrita do autor nos permite sentir o clima, as aflições,
ouvir as vozes, compreender os sentimentos e emoções expostas de forma tão
intensa que leva a seguir às próximas páginas continuamente, sem querer parar
até que chegue a última página.
Sem dúvida, esta é uma leitura que segue!
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