27 setembro 2017

Anna Kariênina | Parte VII


A Parte VII do livro Anna Kariênina, de Liev Tolstói, nos coloca em contato com a angústia que é capaz de sentir o ser humano que põe a responsabilidade pela própria felicidade nas mãos de outra pessoa.

Enquanto Lieven e Kitty viviam a ansiedade da espera pela chegada do primeiro filho e se adaptam à nova realidade de viver em Moscou até o nascimento da criança; Dolly e Oblónksy veem a situação financeira da família piorar cada vez mais, em consequência da vida desregrada que ele mantém e das despesas com os filhos; Serioja passa a estudar em uma escola que o ajuda a superar a ausência da mãe, ao mesmo tempo em que o pai, Alexei Alexandrovich Karenin, encontra na religião o consolo após a separação de Anna Kariênina.

Ela e Vrónski, por sua vez, têm cada vez mais dificuldade para manter a harmonia que, desde os primeiros encontros, dava a tônica da relação. Sem conseguir um acordo com Alexei Alexandrovich Karenin para a efetivação do divórcio, Anna passa a se deixar influenciar pela rejeição da sociedade à sua situação e cobra de Vrónski o cuidado e a atenção que, para ela, representam a compensação ao sofrimento que enfrenta por ter abandonado Karienin e o filho para ficar com o amante.

A cobrança de Anna Kariênina se torna um peso para Vrónksi que, para reafirmar a liberdade da qual não abre mão, apesar do amor que sente por ela, insiste em permanecer em Moscou com uma agenda de compromissos que resulta em pouco tempo ao lado de Anna.

Ele quer provar-me que seu amor por mim não deve tolher a sua liberdade.


Sozinha e entediada com as atividades as quais se propõe a desenvolver para preencher a lacuna do tempo e os pensamentos ociosos, Anna Kariênina entra em uma espiral de amor e ódio por Vrósnki que não consegue mais fugir às provocações da mulher com quem afirma querer se casar.

Sentiu também que, ao lado do amor que os unia, se estabelecera entre ambos um maligno espírito de luta, que ela não conseguia expulsar do coração de Vrónski e menos ainda do seu próprio.


Os pensamentos sobre a morte como única alternativa viável a essa situação voltam a envolver Anna Kariênina que decide ir ao encontro de Vrónski, que foi visitar a mãe no interior antes da partida do casal de volta para o campo. Na estação de trem, Anna se entrega ao desespero e se deixar cair por entre os vagões.

– Não espero que o senhor se lembre de mim, dos meus sentimentos, como deles se lembraria um homem que ama, mas eu esperava simplesmente que tivesse delicadeza – disse Anna.


As tentativas de ajuda recebidas e rechaçadas por Anna ao longo do romance e a negativa em se mostrar frágil diante de si mesma, ao mesmo tempo em que revela depender do outro para ser feliz, revelam não apenas a contradição que é a manutenção da postura para exibir aos outros um ser que, na verdade, nada tem de forte, pois nada mais é do que inseguro em relação a si mesmo e dependente de terceiros.

A irritação que os desunia não tinha nenhuma causa exterior e todas as tentativas de se explicarem um ao outro não só não eliminavam essa irritação, como a reforçavam mais ainda. Tratava-se de uma irritação interior que, para Anna, tinha por base a diminuição do amor de Vrónski e, para ele, o arrependimento de haver se colocado numa situação difícil pelo bem de Anna, a qual, em vez de aliviar tal situação, a tornava ainda mais penosa. Nem ela nem ele declaravam o motivo de sua irritação, mas cada um achava que o outro estava errado e, a qualquer pretexto, tentavam provar isso mutuamente.


Sem dúvida um triste fim para uma personagem tão desenvolta e dona de si, mas que ao longo da trama revelou que somos humanos e que nem sempre estamos nos melhores dias, mas se tem algo de equivocado na postura de Anna, foi não perceber que nem  Alexei Alexandrovich Karenin, nem Vrónski seriam capazes de dar a ela aquilo que só ela mesma pode construir, o amor-próprio.

Todas as tentativas foram feitas, a rosca do parafuso já está gasta.


É esse amor-próprio que orienta a vida de Liéven e de Kitty, que após o nascimento do filho, tentam não apenas se adaptar ao novo integrante da família, mas também aos sentimentos controversos que sentem por ele e com os quais estão aprendendo.

(...) não conseguiam pensar sem terror naquilo que se avizinhava, começaram a experimentar impaciência e inquietude; só Kitty se sentia perfeitamente tranquila e feliz.


Nesta Parte VII, o texto de Tolstói se apresenta em um tom crescente capaz de fazer o coração disparar na medida em que o momento da morte de Anna se aproxima. Intenso, triste e cru, sem o glamour que caracterizava a personagem e que, agora, se foi.

Leitura que segue para a última parte desta que é uma obra simplesmente fantástica! 

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