12 dezembro 2017

A Idade da Razão


Mathieu Delarue é um professor de filosofia que, aos 34 anos, vive em Paris, no período entre as duas grandes guerras mundiais, e que busca manter a coerência entre aquilo que acredita e as experiências vivenciadas. Busca a liberdade acima de qualquer coisa e, por causa dela, mantém uma postura que, para muitos, é previsível e, até mesmo, de causar inveja.

O caminho trilhado por Mathieu parece ser resultado de escolhas racionalmente feitas, até que um dia descobre que Marcelle, a mulher com a qual mantém um relacionamento há sete anos está grávida. A opção pelo aborto é natural, tendo em vista o fato de sempre terem deixado claro um para o outro que não tinham intenção de casar e/ou constituir família.

Até aquele momento, Mathieu e Marcelle afirmavam contar tudo um para o outro, apesar de não terem uma relação oficialmente estabelecida, rotulada. Porém, tudo isso é revisto nas 48 horas que se seguem, pois este é o período que ele tem para levantar o dinheiro para pagar o médico que realizará o aborto.

O primeiro livro da trilogia Os Caminhos da Liberdade, de Jean-Paul Sartre, intitulado A Idade da Razão, nos coloca como expectadores dessas 48 horas da vida de Mathieu e das personagens que, de uma forma ou de outra, interferem na vida do protagonista e o fazem repensar os valores tidos como certezas absolutas até o episódio da gravidez.

Se a liberdade existe e como ela é e/ou pode ser vivenciada são reflexões que Sartre coloca diante do leitor em texto fluido, mas também desconfortável, por nos fazer refletir sobre nós mesmos, ao nos colocar diante dos nossos próprios medos, segredos e inseguranças que, cedo ou tarde, serão revelados não ao outro, mas a nós mesmos.

Esta edição de A Idade da Razão, publicada pela editora Nova Fronteira, que conta com 351 páginas, é um convite ao leitor a olhar para si mesmo e questionar os valores ditos como absolutos para a conquista de si mesmo. É leitura que precisa ser digerida, pois ao mesmo tempo que relata o caso de Mathieu e Marcelle, também orienta reflexões filosóficas de extrema relevância.

Incômodo necessário aos que buscam se aprofundar no conhecimento de si mesmos. 💭

Leitura que segue, no segundo volume da trilogia, Sursi,  par acompanhar os próximos passos da vida de Mathieu.

“Será verdade que sou um salafrário? A poltrona é verde, a corda parece uma alça, isso é indiscutível. Mas em relação às pessoas pode-se sempre discutir, tudo o que fazem pode ser explicado, por cima ou por baixo, como se queira. Recusei porque quero permanecer livre. É o que posso dizer. Mas posso dizer também: tive medo, prefiro minhas cortinas verdes, prefiro tomar ar à tarde no meu balcão, e não desejaria que isso mudasse. Agrada-me indignar-me contra o capitalismo, mas não desejo que o suprimam, porque não  tive motivos de indignação. Agrada-me sentir-me desdenhoso e solitário, agrada-me dizer ‘não’, sempre ‘não’, e teria medo que se tentasse construir para valer um mundo vivível porque teria de dizer ‘sim’ e fazer como os outros. Por cima ou por baixo: que julgaria? Brunet já julgou. Acha que sou um salafrário. Jacques também. Daniel também. Todos decidiram que sou um salafrário. ‘Este pobre Mathieu está perdido, é um salafrário.’ E o que posso fazer contra todos eles? Devo decidir, julgar, mas decidir o quê?” Quando dissera “não”, pouco antes, acreditara estar sendo sincero, um entusiasmo amargo brotara espontaneamente do seu coração. Mas quem poderia conservar nesta luz a menor parcela de entusiasmo? Era uma luz de esperança, eternizava tudo o que tocava.

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