16 outubro 2017

Os Donos do Poder | Capítulo I


Compreender o desenvolvimento do Brasil e o que justifica os caminhos trilhados por este país em sua formação enquanto nação, não é uma tarefa fácil, seja pela dimensão geográfica, diversidade cultural, influências política e jurídica e/ou todos esses elementos reunidos.

Raymundo Faoro, na obra Os Donos do Poder | Formação do Patronato Político Brasileiro, que teve a primeira edição publicada em 1957, apresenta ao leitor, a partir da história da formação do Estado Português, as origens dos caminhos trilhados pelo Brasil, tendo em vista a significativa influencia ibérica na estruturação da sociedade da das instituições nacionais.

Esta perspectiva, que há 60 anos orienta leitores e pesquisadores, é considerada uma obra-prima sobre a formação do Estado Brasileiro e da cultura patrimonial que marca as relações estabelecidas pelos detentores do poder, mesmo em uma democracia representativa.

O primeiro capítulo dos 16 que compõem a obra é intitulado Origem do Estado Português. Neste, Faoro nos mostra como as relações entre o rei, a nobreza, o clero e demais classes que compunham a sociedade portuguesa divergiam do que acontecia na maior parte da Europa e resultou em um modelo a ser adotado no Brasil.

No período entre os séculos X e XIV, há o registro transformações nas relações estabelecidas entre o rei, o clero e a nobreza. Para garantir sua supremacia sobre os demais, o rei passou a dar sustentação às comunas. Formadas por lavradores, artesãos e mercadores, as comunas viabilizavam suporte político, fiscal e militar ao rei, ao mesmo tempo em que enfraquecia o poder da nobreza e do clero.
Buscava o trono a aliança, submissa e servil, do povo - o terceiro estado.


O fortalecimento das comunas levou ao também ao incremento do comércio. A atividade mercantil garantiu a Portugal uma posição de destaque e pioneirismo frente às nações desenvolvidas à época, que estava passando pelas mudanças impostas durante a transição do período medieval para o capitalismo.

Além do pioneirismo mercantil, da posição de destaque nas grandes navegações e na inexistência de uma estrutura medieval, viabilizaram novas estruturas e formas de relacionamento a Portugal. É neste contexto que nasce o Estado Patrimonial.


O Estado Patrimonial não respeitará os séculos, nem os privilégios da linhagem antiga.

Se na perspectiva medieval o poder era dado por Deus aos escolhidos, o modelo patrimonial concentra no rei o poder de distribuir terras, delegar autoridade e a possibilidade de acumulo de riqueza, sem distinção entre o que é público e privado. As empresas públicas que passam a ser instituídas têm na pessoa do rei, o proprietário e mandatário.


Tudo dependia, comércio e indústria, das concessões régias, das delegações graciosas, arrendamentos onerosos, que, a qualquer momento, se poderiam substituir por empresas monárquicas. São os fermentos do mercantilismo lançados em chão fértil. Dos privilégios concedidos — para exportar e para importar — não se esquecia o príncipe de arrecadar sua parte, numa apropriação de renda que só analogicamente se compara aos modernos tributos.

Esta estrutura que mostra a dualidade entre o Estado Feudal e o Estado Patrimonial, tem como base a soma de interesses da nobreza e da emergente burguesia, associadas à ideologia.


A ideologia completará a obra, vencendo as consciências e roubando à imaginação o estandarte da resistência. O Estado patrimonial, implacável nos seus passos, não respeitará o peso dos séculos, nem os privilégios da linhagem antiga.

Neste sentido, as ações de Portugal e as estruturas que dão vida a elas têm como base a perspectiva de Roma, sendo o caráter político a Constituição de Diocleciano (285 – 305) e o do direito, o de Justiniano (527 – 605). Esses elementos deram a sustentação ideológica ao fortalecimento do Estado Patrimonial desenvolvido por Portugal e, posteriormente, trazido para o Brasil.


A direção que suscitou o recebimento do direito romano será de outra índole: a disciplina dos servidores em referência ao Estado, a expansão de um quadro de súditos ligados ao rei, sob o comando de regras racionais, racionais só no sentido formal. A calculabilidade do novo estilo de pensamento jurídico, reduzida ao aspecto formal, não exclui, na cúpula, o comando irracional da tradição ou do capricho do príncipe, em procura da quebra aos vínculos das camadas nobres. Não ganhou a justiça foros de impessoalidade, assegurada nas garantias processuais isentas da interferência arbitrária dos julgados.

Apesar das similaridades, estamos falando da formação do Estado Português. Mas as semelhanças não são, como se vê, coincidências.  Leitura que segue!

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