12 junho 2017

1968: O ano que não terminou

A biografia sempre foi um dos estilos literários que mais me chamou a atenção por ser uma oportunidade que o biógrafo nos dá de conhecer fatos da trajetória do biografado que contribuíram para que se tornasse o que o público conhece. A maioria das pessoas tende a desconsiderar que somos o resultado dos caminhos que escolhemos, apesar de serem eles que, na verdade, nos conduzem.

Escrito pelo jornalista Zuenir Ventura, o livro “1968: O ano que não terminou” é a biografia do ano no qual, entre muitas outras coisas, foi publicado o Ato Institucional n° 5, durante o regime militar, na sexta-feira, 13 de dezembro de 1968. O AI n° 5 significou o estabelecimento da censura, fechamento do Congresso Nacional, suspensão de direitos políticos e demais medidas que configuraram o estabelecimento concreto da ditadura no Brasil.

O livro começa com um relato sobre a festa de réveillon de 1967 para 1968 e segue até o final do ano biografado. Mês a mês, Zuenir Ventura nos apresenta fatos e características culturais, políticas e sociais daquele ano de forma a nos colocar em contato com o início da trajetória de nomes como Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Glauber Rocha, Ferreira Gullar, Caio Prado Jr., José Celso Martinez Corrêa, por exemplo. Ao mesmo tempo, o autor nos apresenta as influências teóricas daqueles que que se tornaram personagens essenciais daquele momento histórico do País, sejam eles civis ou militares, e que nos acompanham até hoje.

Com uma narrativa leve e fluida, a obra possibilita a descoberta de detalhes que nem sempre a história oficial nos conta, por ser um trabalho jornalístico, baseado em depoimentos daqueles que foram atores e testemunhas daquele período, assim como nos documentos registrados à época e preservados que permanecem preservados.

Detalhes sobre o assassinato do estudante Edson Luiz, no restaurante Calabouço, no centro do Rio de Janeiro, pela Polícia Militar, que culminou com a Passeata dos Cem Mil; o boicote ao XXX Congresso da UNE pelos militares, no interior de São Paulo; o Caso PARASAR, plano de integrantes do alto escalão da Força Aérea Brasileira para reprimir passeatas estudantis e manifestações políticas e suas controversas; a 43° sessão do Conselho de Segurança Nacional, realizada no Palácio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro que resultou no AI - 5; entre outros, são encontrados no livro.
Capa do Jornal do Brasil de 14/12/1968 com a íntegra do AI-5

É importante destacar que este é um livro a respeito do ano 1968 e, por esta razão, não aprofunda em suas 268 páginas, apesar de trazer detalhes relevantes, os fatos, mas nos dá os caminhos para dar continuidade à pesquisa sobre o período, ao plantar a semente da curiosidade sobre os caminhos trilhados pelo Brasil que nos trouxeram até aqui.

Aos interessados, uma ótima fonte de informações é o acervo digitalizado do Jornal do Brasil, no qual é possível ler, na íntegra, a primeira edição do JB censurada pelo AI – 5 e publicada em 14 de dezembro de 1968. Aliás, saber como se dava a relação entre jornalistas, censores, políticos, artistas e intelectuais nos permite dar boas risadas, apesar da seriedade do tema. O livro é leve e, ao mesmo tempo, denso, pois viabiliza total identificação do leitor com os fatos narrados. Sim, este sentimento é estranho, mas totalmente real!

Um detalhe a ser destacado é que este livro foi publicado 20 anos depois dos fatos ocorridos, ou seja, na década de 1980. E, em 2008, 40 anos depois do AI – 5, Zuenir Ventura nos traz a segunda parte da obra:  “1968: O que fizemos de nós” que, em breve, também será registrado por aqui.

Este é um livro que abre portas a um mundo de pesquisa para a construção da cidadania individual e do fortalecimento de nossas bases democráticas (ou não, né?! 😕). A história é cíclica e, sendo assim, o conhecimento dela nos permite aprender com os acertos e erros, ao mesmo tempo em que nos ajuda a evitar que equívocos se repitam. Vale a leitura!  







A história do ano não acaba aqui. Na verdade, era apenas o começo. 1968 entrava para a História, se não como exemplo, pelo menos como lição.

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