A leitura dos dois livros de Zuenir Ventura, “1968: O anoque não terminou”
e “1968: O que fizemos de nós”, sobre os fatos e personagens que marcaram não apenas aquele ano, mas a
história do Brasil desde então, trouxeram à memória uma entrevista do também
jornalista Fernando Gabeira, ao programa Roda Viva, em março deste ano.
Gabeira é citado nas duas obras por sua participação no
movimento estudantil e na luta armada contra a ditadura militar. Nos livros de
Zuenir, ele aparece como uma figura controversa, por suas posições incisivas e,
por vezes, polêmicas, ao mesmo tempo que coerentes com os pensamentos que expõe
e a trajetória que construiu. A entrevista concedida por ele e publicada na
segunda parte do livro dois nos incita reflexões a respeito dos caminhos ideológicos
e políticos seguidos pelo Brasil que não são fáceis de responder. Em alguns
casos, talvez nem seja possível.
A edição do programa Roda Viva, gravada em 06 de março de
2017, aconteceu dias antes do lançamento do livro “Democracia Tropica. Caderno
de um aprendiz”, no qual Gabeira faz uma análise sobre a trajetória nacional no
período compreendido entre o movimento das Diretas Já até a eleição de Dilma
Rousseff. Esta obra já entrou para a lista de próximas leituras. 😉
Além de falar sobre o livro, Gabeira expôs erros e acertos
de sua atuação enquanto deputado federal; detalhes das campanhas que participou;
o que o fez deixar o pensamento de esquerda e aderir ao de direita; revelou
detalhes sobre sua vivencia no Partido Verde, a curta passagem pelo PT, e o
retorno ao PV; falou sobre machismo; a tendência mundial de adesão ao
conservadorismo; entre outros temas.
Uma coisa que as eleições me mostraram no Brasil, e é muito forte, é a cultura da dependência. Nós não preparamos os brasileiros para eles serem livres e responsáveis. De um modo geral, a gente prepara para depender de alguma coisa. E eu não me refiro apenas ao homem ou a mulher humilde que recebem o Bolsa Família, porque sempre se pergunta nas eleições: Se a oposição vencer, eu vou continuar com meu Bolsa Família? E há sempre os marqueteiros do governo para responder rapidamente: Não! Se a oposição vencer, vocês vão perder o Bolsa família. Mas eu fiquei mais espantado ainda, em 2010, com a cultura da dependência entre os prefeitos. De 94 prefeitos, 93 apoiaram o Sérgio Cabral. E quando você ia fazer campanha no interior e tentava de alguma maneira convencer os funcionários públicos, a ordem que vinha dos prefeitos era a seguinte: Olha, se nós perdermos essas eleições, vocês vão perder o emprego também. Então cria uma cultura da dependência que é tão forte as vezes na formação da eleição quanto essa fortuna que eles jogam no marketing, entende?!
Em cerca de uma hora e meia de programa, Gabeira dá uma demonstração
de como é possível ser oposição e/ou mudar de lado, com argumentos (se
concordamos ou não é outra história!) e, sobretudo, se permitindo compreender
os movimentos da sociedade sem posições cegas e extremistas.
Vale dedicar alguns minutos do dia a esta entrevista, tanto pelo conteúdo de alguém que fez e faz parte da história nacional, quanto pelo
exemplo de postura que demonstra ser possível discordar sem, necessariamente, odiar. 💭
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