Em artigo publicado em 1996, sob o título Os avanços e os dilemas do modelo
pós-burocrático: a reforma da administração pública à luz da experiência
internacional recente, o cientista político Fernando Luiz Abrúcio apresenta
como questionamento central, algo que a sociedade brasileira ainda tenta responder:
que tipo de Estado se deseja para o
século XXI?
A partir da experiência britânica de reforma
administrativa do Estado, a partir da década de 1980, Abrúcio (1996) apresenta
um breve resumo da história da inserção do pensamento e da prática gerencial na
gestão pública, que representou um novo paradigma administrativo.
A constituição de um modelo pós-burocrático, observa o
autor, resulta das críticas que passam a ser feitas ao modelo burocrático
weberiano e à estrutura de Estado vigente até a década de 1930, baseada em três
pilares: Econômico (Modelo Keynesiano); Social (Welfare State); e
Administrativo (Modelo Burocrático Weberiano).
Segundo Abrúcio (1996), esta estrutura estatal, que
teve seu período de vigência entre o pós-Segunda Guerra Mundial e a Crise do
Petróleo de 1973 (Guerra do Yom Kippur), entrou em declínio por causa de quatro
fatores socioeconômicos, a saber: a crise econômica causada pela Crise do
Petróleo; a crise fiscal e o enfraquecimento de apoio dos contribuintes ao
modelo de Estado vigente; a ingovernabilidade gerada pela divergência entre os
que não abriam mão daquilo que consideravam conquistas (sociais) e os que viam
essas mesmas conquistas como privilégios; a globalização e o avanço da
tecnologia resultaram em transformações no setor produtivo e ao consequente
incremento dos questionamentos sobre o custo do trabalhador.
A nova perspectiva estatal tinha como meta, observa
Abrúcio (1996), a eficiência que passa necessariamente pelo corte de custos. Porém,
esses cortes resultam em efeitos não previstos à administração pública que
resultam na reformulação do modelo pós-burocrático, iniciado com o managerialism, que nasceu nos Estados
Unidos, no final do século XIX, com o artigo The study of administration, publicado por Woodrow Wilson (1887).
Sob essa perspectiva, Abrúcio (1996) destaca a
impossibilidade de existência de um modelo único, mesmo que as críticas ao
modelo weberiano sejam as mesmas e baseadas na perspectiva do processo autorreferenciado,
com ênfase nos meiose às regras, em detrimento de uma ação pública vinculada
aos objetivos.
A respeito da dificuldade de estabelecer um modelo
pós-burocrático único e imutável se deve ao fato de a reforma administrativa do
Estado precisar levar em consideração os aspectos políticos, que alguns
estudiosos tentaram ignorar, na tentativa de importar o perfil cultural do
setor privado para o público, apesar deste ter como característica essencial as
relações complexas que o constituem.
O fato é que a administração pública constitui um sistema organizacional em que, internamente, há diferentes tarefas e valores, os quais pertencem a um contexto complexo de relações com a esfera política.
(Gray
& Jenkins, 1995: 85, apud: Abrúcio, 1996: 184)
Neste sentido, o managerialism,
considerado como o neotaylorismo, se desenvolve para o consumerism, para, em seguida, assumir a perspectiva do public service orientation. Abrúcio
(1996) ressalta que a passagem de uma teoria para outra se dá numa crescente
inclusão e revisão de temas, que passam desde a compreensão da sociedade apenas
como contribuinte, passando pela noção de cliente/consumidor, até chegar a
perspectiva de cidadania, que implica direitos e deveres por parte do
indivíduo.
Para Abrúcio (1996, 191):
Para se reformar o Estado é preciso conjugar a temática da cidadania com a da introdução de um novo modelo organizacional para o setor público.
Para isso, é preciso levar em consideração o caráter
político da reforma da administração pública; a importância do corpo
burocrático para o Estado; a apropriação e definição de mecanismos contratuais
de gestão; estratégias para viabilizar a descentralização ao mesmo tempo em que
se minimizam os impactos do aumento das desigualdades e da fragmentação da
prestação de serviços viabilizadas por ela; e a reversão dos prejuízos à
aprendizagem organizacional, resultante da separação entre formulação e
implementação de estratégias.
Não é por acaso que Abrúcio (1996) destaca a
importância do estudo das instituições e seus respectivos contextos, pois, o sucesso do modelo gerencial na
Grã-Bretanha se deu exatamente em função das condições políticas existentes.
Ou seja, não existem receitas infalíveis e/ou alternativa exclusivamente
técnica.
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