À medida que fui avançando nas páginas para acompanhar – ou ao
menos tentar – o pensamento desenvolvido por Adam Smith em sua obra
“A Riqueza das Nações”, uma constatação recorrente me vinha à
mente: pesquisadores, aprendam com este senhor o que é um trabalho
de pesquisa!
Chega a ser inacreditável o que o filósofo e economista escocês
conseguiu fazer em meados do século XVIII, um período no qual o
acesso à informação, nem nos melhores sonhos, se aproximava do que
temos hoje. E mesmo assim, temos uma obra digna de ser chamada de
pesquisa.
Adam Smith compilou quantidade significativa de dados que incluem
preços de determinados produtos, praticados em diversas localidades
da Europa, nas colônias europeias na Africa e América; a influência
das descobertas de riqueza ao redor do mundo no desenvolvimento da
atividade produtiva das metrópoles; o impacto da cultura nas
relações entre proprietários, trabalhadores e empregadores; a
importância da cadeia produtiva e como ela pode ser determinante na
formação de preços; entre outros dados, sempre apresentados de
forma explicativa para que o leitor - independente do seu nível de
compreensão a respeito da economia -, compreenda seus fundamentos
sobre a riqueza das nações e formação da sociedade como
conhecemos.
Publicado em 1776, a obra “A Riqueza das Nações” é composta
por cinco livros divididos em dois tomos. Cada livro, considerado um
capítulo, aborda uma temática que, de acordo com o autor, auxilia a
investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações.
O tomo I inclui dos Livro I ao IV, que tem continuidade no tomo 2,
composto também pelo Livro V.
Conclui a leitura do Livro I, intitulado “Causas do aprimoramento
das forças produtivas do trabalho, e da ordem segundo a qual seu
produto é naturalmente distribuído entre os diferentes estratos do
povo”. Sim, o capítulo é tão grande quanto o título e consome
mais de 50% das 623 páginas da obra. Trezentas e trinta e cinco,
para ser mais precisa.
Apesar de não ser uma leitura fácil, daquela com as quais nos
jogamos no sofá para relaxar, pois esta obra que exige um
significativo esforço mental, ela nos orienta por reflexões
essenciais, não somente nos aspectos econômicos, mas também
históricos a respeito de aspectos culturais de uma sociedade que
ainda serve como base para muitas das nossas práticas cotidianas.
Quais as consequências para a sociedade brasileira contemporânea da
informação que Smith nos dá ao dizer que:
(…) poderíamos afirmar que a quantidade de ouro anualmente importada do Brasil para Lisboa foi de 18 milhões de cruzados, ou 45 milhões de libras francesas, equivalentes a 2 milhões de libras esterlinas. (…) levando em conta o que pode ter sido contrabandeado, podemos seguramente adicionar a essa soma mais 1/8, ou 250 mil libras esterlinas.
E para nós, o que restou?
Ao abordar questões como a divisão do trabalho, a origem e o uso do
dinheiro, as partes componentes do preço, os salários do trabalho,
o lucro do capital e a renda da terra, por exemplo, Adam Smith revela
a base machista da diferenciação do salário de homens e mulheres,
pois cabe a estas a obrigação (termo utilizado pelo autor) de
cuidar dos filhos. Assim, apesar de ter que trabalhar para suprir as
demandas do mercado, não é necessário pagar a elas o mesmo
salário, pois o básico à subsistência é suficiente.
Famoso por ser um dos nomes mais importantes do liberalismo, Smith
destaca a importância da livre iniciativa e os problemas causados ao
mercado pela intervenção do Estado com o objetivo de regular as
relações entre proprietários, trabalhadores e empregadores. Porém,
o autor faz a ressalva de que o grupo que efetivamente pressiona o
Estado para garantir seus interesses é a dos empregadores e,
diferentes dos outros dois grupos, este não pensa na coletividade,
tendo em vista ter como foco o aumento do lucro do capital. Irônico,
não?
Até este ponto da leitura, é possível afirmar que através de uma
argumentação bem embasada, Adam Smith é capaz, sim, de nos fazer
refletir a respeito dos malefícios que podem ser causados pela
intervenção do Estado na economia, ao mesmo tempo em que considera
essencial a manutenção da subsistência digna (termo também usado
pelo autor) dos trabalhadores. Assim, o que me parece, este
antagonismo nos leva ao necessário equilíbrio entre os dois
caminhos, mesmo que ele seja utópico.
Sigo a leitura para ver se o autor nos mostra o caminho para esta
resposta. Volto com Adam Smith ao final do Livro II - “Natureza, acumulação e
emprego do capital.” Até lá!
Decerto, nenhuma sociedade pode ser próspera e feliz, se a maior parte dos seus membros está reduzida à pobreza e à miséria.☕💭