Com uma ficha catalográfica que o identifica como um livro de
ficção do século 20, a primeira parte de O
Senhor dos Anéis, intitulada A
Sociedade do Anel, nos leva a perceber que não importa o período em que
vivemos, as discussões a respeito dos valores morais sempre darão a tônica das escolhas
feitas pela sociedade, seja ela de hobbits, homens, elfos, magos ou anões.
O autor da obra publicada pela editora Martins Fontes, o
inglês J. R. R. Tolkien é um homem que, assim como boa parte de nós, viveu
entre dois séculos, de 1892 a 1973, o que o permitiu a acompanhar grandes
transformações e conflitos da sociedade, incluindo as duas grandes guerras.
Tolkien afirmou em diversas ocasiões que a obra é uma
fantasia ficcional e que não tem relação com as experiências vivenciadas por
ele. Mesmo que o escritor não tenha tido a intenção, pergunto a você meu caro leitor,
se é possível criarmos qualquer coisa sem colocar nela um pouco de nós mesmos.
Penso que não, mas deixo a você a palavra final.
“Folha e ramo, água e
rocha: elas têm a beleza de todos esses elementos sob nosso amado crepúsculo de
Lórien, pois colocamos o pensamento de tudo o que amamos nas coisas que fazemos.
”
Na saga de Frodo pela Terra Média com o objetivo de destruir
o Um Anel, temos a oportunidade de acompanhar as transformações que as
responsabilidades que nos são dadas são capazes de imprimir em cada um de nós e
nas relações que estabelecemos.
A possibilidade de ascensão, conquista de poder e do status
que dele decorre faz com que nos deparemos com o melhor e o pior de nós mesmos.
Somos testados constantemente, assim como aqueles que são colocados diante do
Um Anel e do poder que através dele podem emanar. É uma questão de escolha:
pensar em si mesmo ou na coletividade? Eis o dilema enfrentado por Frodo!
Se os ambientes desta natureza são mais do que propícios às
traições e lutas desleais, neles também encontramos companheiros de jornada que
despertam nossa admiração e respeito, nos inspirando a permanecer firmes em
nossos propósitos e a evoluir, sempre. É exatamente o que acontece com Frodo,
que sai do Condado em uma missão que acredita ser levar o Um Anel até Valfenda para
entrega-lo aos elfos, para que o mantenham em segurança, longe dos olhos de
Sauron. Mas quando chega ao destino, o portador do anel percebe que terá que sua
viagem não acabou e terá que ir ao encontro do Senhor do Escuro.
A comitiva formada para acompanhar Frodo em sua jornada é formada
por nove representantes, mesmo número de Cavaleiros Negros que o persegue até
chegar à Valfenda. É na longa viagem e a cada obstáculo que Frodo vai
conhecendo e descobrindo em quais dos integrantes da comitiva do anel pode
confiar. É nesta viagem, também, que tem a oportunidade de conhecer a si mesmo,
assim como a dualidade de luz e sombra que nos compõe e norteia as escolhas que
fazemos dia após dia.
“Esta noite, não
sobrecarreguem seus corações pensando no melhor caminho. Pode ser que as
trilhas nas quais cada um de vocês deve pisar já estejam diante de seus pés,
embora talvez não consigam enxerga-las. Boa noite! ”
Se a narrativa de ficção fantástica de George Martin, em As crônicas de Gelo e Fogo, é frenética
e excitante a cada capítulo, o texto de Tolkien é mais lento, intercalando
momentos de grande euforia, com outros de leitura harmoniosa, porém não menos
envolvente.
O Senhor dos Anéis
– A Sociedade do Anel nos apresenta
um mundo completamente novo, assim como a maior parte dos seres que o habitam,
apesar de seu hábitos e costumes terem muita similaridade com os nossos. Tudo é
apresentado em um texto bastante descritivo que, apesar disso, não é cansativo,
pelo simples fato de ter sido tão bem elaborado que nos transporta para o local
narrado, gradativamente, na medida em que a leitura avança. É uma viagem
sensacional!
Aos que, assim como eu, gostaram muito dos três filmes que
levaram para a tela do cinema a saga de Frodo pela Terra Média, duas colocações
a fazer. A primeira é que é inevitável a visualização das cenas dos filmes
enquanto a leitura acontece, o que leva à segunda colocação, pois nem sempre o
que está em um aconteceu no outro, como toda boa adaptação de livro para filme.
Vale salientar que cada filme da trilogia (A Sociedade do Anel, As Duas Torres e O Retorno do Rei) conta com cerca de 3
horas de duração, para uma média de 400 páginas por livro. Na minha edição, A Sociedade do Anel conta com 426
páginas que, sem dúvida alguma, valem a leitura!
“Não, o tempo não para nunca - disse ele -, mas a mudança e o crescimento não se manifestam em todos os seres da mesma forma. ”