Não sei quanto a você, mas a imagem que sempre criei ao
ouvir alguém falando a respeito dos filósofos era de homens de meia-idade,
sérios, com olhar reflexivo e sempre ponderados em suas colocações. O verbo é
no passado mesmo, pois após a conclusão da leitura do livro A Arte de Escrever,
de Schopenhauer, da L&PM Editores (2013), tudo mudou.
A obra, que integra a coleção L&PM Clássicos, é composta
por cinco artigos do filósofo alemão, Arthur Schopenhauer (1788-1860), nos
quais ele fala “Sobre a erudição e os eruditos”; “Pensar por si mesmo”, “Sobre
a escrita e o estilo”; “Sobre a leitura e os livros”; e “Sobre a linguagem e as
palavras”. Neste livro é possível conhecer muito mais do que os pensamentos do
filósofo já que, a cada linha, ele revela os fortes traços de sua
personalidade.
Além de analista da língua, o que considera “uma obra de
arte e (que) deve ser tratada como tal”, Schopenhauer é crítico do trabalho de
outros escritores alemães, aos quais não poupa elogios depreciativos como
descerebrados, medíocres, patifes e burros, e nem hesita em citá-los
nominalmente em seus textos, como Hegel.
O incômodo que o alemão sente diante dos trabalhos
publicados por parte dos seus contemporâneos e – para seu desgosto – consumidos
pela sociedade à época como clássicos, tem como causa o que o autor considera a
depreciação da língua. Schopenhauer acredita que a superficialidade predominante
à época, resulta do posicionamento cada vez mais afastado que os escritores
adotam em relação às regras gramaticais e ao uso adequado de termos
significados e estruturas clássicas.
“Não há nenhum erro
maior do que o de acreditar que a última palavra dita é sempre a mais correta,
que algo escrito mais recentemente constitui um aprimoramento do que foi escrito
antes, que toda mudança é um progresso. ”
Veja que ele fala do processo produtivo de meados do século
XIX, dá para imaginar o que diria sobre a era do compartilhamento?
O filósofo alemão destila sua ira ao falar a respeito dos
que escrevem para ganhar dinheiro -
incluindo os jornalistas-, prática que, segundo ele, diferencia tais
escritores por completo daqueles que de maneira honrosa são denominados de
filósofos clássicos. Neste sentido, Schopenhauer destaca que a qualidade da
escrita é um reflexo da qualidade do pensamento do autor.
“(...) escrever mal, ou de modo obscuro, significa pensar de modo
confuso e indistinto. (...). A obscuridade e a falta de clareza da expressão
são sempre um péssimo sinal. Pois em noventa e nove por cento dos casos elas se
baseiam na falta de clareza do pensamento, que por sua vez resulta quase sempre
de um equívoco, uma inconsistência e incorreção mais originais. ”
Para chegar a este nível de clareza, diz Schopenhauer, não
se deve ler exaustivamente, como costuma-se dizer. O escritor alemão afirma que
apenas os que têm o dom da escrita conseguirão aprender a partir dos exemplos
de outros escritores e selecionar o que devem ou não fazer em sua própria
construção textual.
O alemão inicia seus escritos afirmando que aqueles que leem
exaustivamente, estão, na verdade, impondo pensamentos exteriores ao seu
imaginário, na medida em que o impedem de exercer reflexões próprias. Esta
prática - a do estímulo e prática dos
próprios pensamentos - é, segundo
Schopenhauer o caminho para o prazer e a felicidade.
“A leitura impõe ao
espírito pensamentos que, em relação ao direcionamento e à disposição dele
naquele momento, são tão estranhos e heterogêneos quanto é o selo em relação ao
lacre sobre o qual imprime sua marca. Desse modo, o espírito sofre uma
imposição completa do exterior para pensar, naquele instante, uma coisa ou
outra, isto é, para pensar determinados assuntos aos quais ele não tinha na
verdade nenhuma propensão ou disposição.”
Vale destacar que, se me conhecesse, Schopenhauer teceria
críticas a mim por ser Jornalista, por ter lido um livro que não é o dele, mas
de artigos selecionados por terceiros, e por estar escrevendo esta resenha. Ah!
Certamente ele o criticaria também, prezado leitor, por consumir este tipo de material!
Rs... Para o filósofo, se queremos conhecer o pensamento de alguém, devemos ir
ao original, ao clássico que, não à toa, recebeu esta denominação!
Mas não pense que os textos de Arthur Schopenhauer se
resumem às críticas. Não! Os escritos abordam temas como neologismos, prolixidade,
sufixos, prefixos, objetividade, subjetividade, anonimato, figuras de
linguagens, tempos verbais, clareza, concisão, entre outros que – se bem
dominados - auxiliam n’A Arte de Escrever.
Ao mesmo tempo, o filósofo ressalta ser este um fazer que, apesar de sua
condição de arte, requer dedicação e esforço: “Dizem que Platão redigiu a introdução de sua República sete vezes, com
diversas modificações”.
Vale a leitura!
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