Há poucos dias uma pessoa reclamava das críticas que têm sido
feitas ao ano de 2016. Segundo ela, o ano não nos fez absolutamente nada, foi
apenas ele em sua contagem de tempo para balizar nossas ações.
Concordei com o argumento, pois ao ano é apenas um ciclo que
nada tem de bom ou de ruim. Esta avaliação é subjetiva e esta subjetividade
resulta das características que cada um de nós imprime ao tempo. E neste
período propício a este tipo de avaliação, lembrei do texto de Raul Pompéia, em
um dos clássicos da literatura brasileira, “O Ateneu”, que reli no final deste
ano.
Nesta obra, considerada uma autobiografia do autor, Pompéia
nos apresenta as memórias de Sérgio, aluno de O Ateneu, um renomado internato
masculino do Rio de Janeiro do final do século XIX.
Em um dos períodos de final de ano letivo, Sérgio – que é o
narrador do livro – questiona:
“Que significa 30 de dezembro? Fim de ano! E todo o fim é patético, todo fim lança nuvens de tristeza num coração que não é de pedra, todo fim comove! ”
E como comove! Tanto que, à época da leitura, destaquei este
trecho justamente para usá-lo na data de hoje, pelo clima nos envolve.
A obra de Raul Pompéia é uma crítica ao modelo pedagógico vigente
naquele período, mas vai além.
O livro também nos revela como se dão as relações
de poder dentro da instituição, inclusive entre os estudantes; como se dá a
descoberta de si mesmo naquele ambiente, em consequência direta das relações
formadas e firmadas ao longo dos anos e dos objetivos pretendidos.
Esta realidade é bem caracterizada pelas palavras do pai de
Sérgio ao filho, em frente à escola, registradas nas primeiras linhas da obra:
“Vais encontrar o mundo – disse-me meu pai, à porta do Ateneu. - Coragem para a luta.”
A cada página, acompanhamos o desenvolvimento de Sérgio, a
partir das próprias contradições -
inerentes ao ser humano -, mas que se revelam grandes obstáculos para o
jovem estudante que, no internato, tem os primeiros contatos com o
autoritarismo, a sexualidade, amizade, paixões.... Enfim, com o mundo.
Neste momento em que estamos diante do início de um novo
ciclo, como quando Sérgio esteve à frente do Ateneu, podemos fazer
questionamentos análogos ao do protagonista de Pompéia, sobre qual o
significado de 31 de dezembro. Avançando um pouco mais, podemos nos perguntar,
por exemplo, o porquê de 2016 estar sendo responsabilizado pelas consequências das
nossas atitudes e o que faremos efetivamente para evitar que aquilo que não gostamos
se repita e mudar. Esse balanço é determinante para o que plantaremos a partir
de amanhã e avaliaremos no final do próximo ano. Pois, agora, estamos colhendo
o que foi plantado lá atrás.
Sérgio percebeu que nossas experiências nos moldam, mas
somente até o ponto que cada um de nós permitir. Temos livre-arbítrio para ser
e agir como quisermos, mas que devemos também levar em consideração as consequências
dessas escolhas aos que nos rodeiam. Pois elas acontecerão!
Em essência,
precisamos lembrar que tudo o que temos hoje são recordações, como nos disse o
narrador:
“Saudades verdadeiramente? Puras recordações, saudades talvez se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas sobretudo - o funeral para sempre das horas.”
Então, qual é o significado de 31 de dezembro?
Reflexão Sérgio, em O Ateneu, sobre o significado do fim |