A vida nos surpreende diariamente ao nos colocar em contato
com os mais diferentes tipos de pessoas. É através delas que descobrimos
possibilidades; conhecemos e reconhecemos mais sobre nós mesmo; e encontramos inspirações
e motivos para escolher este ou aquele caminho a seguir.
A nossa trajetória é tão impregnada pela influência do outro
que, muitas vezes, temos a necessidade de afirmar independência apenas para
tentar convencer à nós mesmos que alguma liberdade nos resta, mesmo que nossos
atos revelem o contrário, deixando clara a incoerência que nos orienta.
Os seis meses de convivência de Will Traynor e Lou Clarck,
em “Como eu era antes de você” (Jojo Moyes | Editora Intrínseca), pode parecer
um período curto para envolvê-los em uma relação de almas tão intensa. Porém, a
cronologia não tem capacidade de interferir na sintonia que penetra o mais
íntimo do ser em encontros que chegam ao ponto de revelar aquilo que tentamos
esconder, inclusive de nós mesmos, sob sete chaves.
Lou se descobre a partir da luta que trava para tentar fazer
com que Will perceba que, apesar de todas as dificuldades que a vida como
tetraplégico o impõem, há razões para viver e que as barreiras que enfrenta não
precisam ser vistas como empecilhos à felicidade, mas sim estímulo à
criatividade para encontrar alternativas aos padrões ditos normais. Sim, sempre
há alternativa!
Os valores morais ditados pela sociedade e que orientam o
nosso caminhar muitas vezes nos levam a uma busca de encaixe aos estereótipos que
resultam em feridas no nosso próprio eu.
Lou se esconde dela mesma após um suposto estupro na
adolescência, do qual ela se sente culpada, até que Will a faz ver que a vítima
nunca tem culpa. Ela nem mesmo tinha noção do quanto este episódio não revelado
a levou a optar por um estilo de vida sem vida e/ou expectativas. Se conformou
com um dia após o outro, enquanto ele viveu intensamente tudo o que a beleza, o
dinheiro e uma carreira bem-sucedida poderiam oferecer. Até que um atropelamento
uniu as duas vidas, até então, completamente antagônicas e que dificilmente se
encontrariam.
O relato de Lou sobre esta convivência nos leva a
questionamentos como: Podemos mesmo prever o que o a vida tem guardada para
nós? O que estamos perdendo ao simplesmente excluir de nossas vidas tudo aquilo
que consideramos não estar em nossos planos, sem ao menos levar em consideração
que sempre há uma razão para os inesperados encontros e alternativas que
desconhecemos? Sobre o que temos controle, afinal?
A forte personalidade de Will e de Lou resulta em
diálogos rudes, sarcásticos, inteligentes e repletos de descobertas, tanto a respeito deles
mesmos como do mundo que os rodeia e complementa. E diante de tantas diferenças
e similaridades, eles se descobrem. E, a partir das conversas e experiências cognitivas,
ganham cada vez mais espaço na vida e nos pensamentos um do outro, o que revela
o poder das palavras e das interações sinceras, de alma, daquelas em que uma
troca de olhares é suficiente para acalentar e dar sentido a tudo, por
mais que fuja aos padrões preestabelecidos. Afinal, quem os ditou não conhecia
todas as possibilidades. Ninguém as conhece, não é mesmo?
Dentre as várias lições que o livro nos traz em suas 318 páginas está a
importância de nos permitir conhecer o outro e viver as experiências que a vida
nos oferece, assim como perceber o diferente como novas possibilidades e
oportunidades, livre de prejulgamentos.
A narrativa de Jojo Moyes nos faz enfrentar uma montanha
russa de emoções capaz de tirar o fôlego diante da densa forma com que Lou
Clark nos revela seus pensamentos, percepções e sentimentos.
Sem dúvida, vale muito a leitura! Classificação 5/5.
O Filme
A filme estrelado por Emilia Clarke (Louisa Clark) e Sam
Claflin (Will Traynor) nos tira muitas risadas e lágrimas, ao nos revelar a
síntese da obra. E apesar de, como uma boa adaptação, alterar acontecimentos e
excluir fatos e personagens, dá uma boa noção do que o livro revela e as reflexões
que propõe sobre vida e morte, valores sociais e nossa postura diante de nós
mesmos e dos outros.
Vale a ida ao cinema, mas não substitui a leitura! Classificação
3/5.
E pronto. Ele sabia e eu também. Não havia mais nada que eu pudesse fazer. Sabe como é difícil não dizer nada? Quando seu corpo inteiro quer fazer o contrário? Eu ensaiara não dizer nada durante todo o caminho do aeroporto até ali, e ainda assim aquilo estava quase me matando.