24 dezembro 2023

A mágica da escrita

 Escrever é um processo mágico. Mais do que registrar pensamentos, sentimentos, experiências e aprendizados, a escrita é uma forma de construir ideias, conectar dados, formular informações, compreender o mundo, enfim, de produzir conhecimento que sem esse esforço de sistematização não se tornaria realidade, se perdendo no tempo, como ao passar do vento.

O ato da escrita dá significado à vida na medida em que materializa o viver nosso de cada dia. Isso acontece porque escrever requer da memória um trabalho extra que, em uma espécie de movimento cíclico, reforça a aprendizagem que nos propomos a registrar e, entre outras coisas, nos leva a observar aspectos daquele conteúdo que a um primeiro olhar podem ter passado despercebido, mas estão ali e ampliam o significado daquela experiência quando racionalizados.

O papel da memória é resumir as coisas. Por outro lado, falar e escrever são formas de linguagem que nos ajudam a conhecer e a dominar as especificidades daquelas coisas. E, a cada contato com o papel e a caneta e/ou com o teclado e a tela, como queira, está feito o convite para o mergulho em um mar de detalhes que não cabem em um resumo, pela própria estrutura deste. 

E se nos permitirmos avançar nesta reflexão, chega agora às ideias, enquanto escrevo, a observação de que o convite ao mergulho que a escrita nos faz é o mesmo que recebemos cotidianamente diante da leitura e do processo de aprendizagem, de forma geral. Afinal, um resumo será sempre um conjunto estrito de informações sobre determinado tema que para ser de fato conhecido requer de nós a disponibilidade de trabalhar no mergulho.

Uma aula, uma resenha, uma publicação em rede social, uma manchete de jornal são exemplos de resumos elaborados por pessoas que, mesmo que queiram, não são capazes e transmitir tudo o que conhecem a respeito do assunto abordado. Além do espaço ser restrito, o conhecimento é construído individualmente.  

Essas iniciativas devem ser compreendidas como mediações, ou seja, orientações para que cada um de nós, de acordo com os respectivos interesses e necessidades, mergulhe nas páginas do livro, do jornal, no tempo de duração de um filme, de uma música, da experiência sobre a qual se quer aprender.

Pode até parecer, mas não, este não é um manifesto contra os resumos. Ao contrário disso, as informações neles contidas são orientadoras dos caminhos a serem seguidos porque o resumo não morre em si mesmo. Mas a experiência que leva à construção do conhecimento é pessoal e intransferível. 

  Exemplo disso foi a orientação recebida sobre uma nova perspectiva de leitura do livro “Memórias de um sargento de milícias”, escrito por Manuel Antônio de Almeida, em meados do século XIX, relacionando o conteúdo da obra com a estrutura cultural e de poder que dominam o Rio de Janeiro contemporâneo. A orientação explica, mas não reproduz a experiência que, por sua vez, só será sentida se e quando a releitura do livro acontecer e a constatação das similaridades for confirmada ou não. Sim, pois, o elemento “percepção” é outro fator pessoal e intransferível, e, ao mesmo tempo, determinante de toda experiência. 

Aliás, o livro de Manuel de Antônio de Almeida está em domínio público e para ter acesso a ele gratuitamente, clique neste link: Domínio Público

Ao voltar para o início deste texto, é possível identificar a mágica da escrita, ao permitir esse encadear de palavras, sentidos, experiências e memórias. Por isso, vá além do resumo, escreva. A memória da sua própria existência agradece! 

O conhecimento é construído individualmente.


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